Seringueira e cacau: consórcio pode ser alternativa viável e rentável no Noroeste Paulista Cleusa Pinheiro - Jornalista - Centro de Comunicação Rural (Cecor/CATI)

Seringueira e cacau: consórcio pode ser alternativa viável e rentável no Noroeste Paulista Destaque

Escrito por  Jan 11, 2019

O Estado de São Paulo é o principal produtor de borracha natural do Brasil, com cerca de 110 mil hectares de florestas plantadas, onde, em 2017, foram produzidas 98 mil toneladas de borracha seca, o que corresponde a 56% da produção. No entanto, nos últimos anos, foi identificada uma queda na implantação de novos seringais na região de São José do Rio Preto, localizada no noroeste paulista, a qual é a maior produtora do Estado, com cerca de 33 mil hectares, onde se concentram cerca de 15 milhões de seringueiras cultivadas, distribuídas em sua maioria em pequenas propriedades de até 20 hectares, as quais abrangem 73% da área total do Estado.

“A receita oriunda do setor de borracha em nossa região está em torno de R$ 138 milhões de reais/ano, sendo a maior parte desses recursos distribuída entre pequenos e médios produtores. Sendo assim, a heveicultura tem uma grande importância socioeconômica caracterizada pela geração direta e indireta de empregos no meio rural, bem como de renda, que movimenta a economia, principalmente dos pequenos municípios. Contudo, esse valor tem oscilado em função da queda do preço da borracha no mercado internacional, o que tem refletido na falta de motivação de muitos produtores para novos plantios e a exploração da seringueira, pois eles têm sentido uma redução da renda por unidade de área”, analisa Pedro Cavallini Neto, diretor da CATI Regional São José do Rio Preto.

Nesse contexto, há quatro anos, os extensionistas da CATI que integram o grupo técnico de heveicultura na Regional São José do Rio Preto vêm buscando alternativas que aumentem o retorno financeiro por hectare. “Até o momento, temos desenvolvido uma série de ações como capacitações técnicas de produtores e sangradores, acesso ao crédito rural, Dias de Campo, incentivo à adoção do Protocolo de Boas Práticas Agropecuárias, trabalhos com crédito de carbono e implantação de consórcios, os quais permitem o fortalecimento das atividades agrícolas de forma sustentável, pelo fato de otimizarem o uso de recursos (solo, água, mão de obra, máquinas e equipamentos); melhorar o fluxo de caixa; e diminuir o risco econômico, por conta do cultivo simultâneo na mesma área de duas ou mais culturas, o que diminui a necessidade de explorar novas áreas e gerar impactos à natureza”, explicam os engenheiros agrônomos Andrey Vetorelli Borges e Fioravante Stucchi Neto, membros do grupo.

No contexto dos consórcios, os técnicos falam sobre integração seringueira e cacau. “Temos acompanhado os bons resultados da consorciação entre a seringueira e outras culturas, como é o caso da banana, pois os consórcios promovem um retorno econômico atrativo, além de ser um modelo sustentável do ponto de vista socioambiental. Em busca de novas opções, em conjunto com outras entidades e produtores, identificamos boas perspectivas no Sistema Agroflorestal (SAF) da seringueira com o cacaueiro, cultura cujos produtos possuem mercado e fácil comercialização e tem despertado o interesse entre os heveicultores da região”.

 


Por isso, visando esclarecer dúvidas e identificar a viabilidade do sistema na região, com embasamento técnico de estudos científicos, a CATI, em parceria com o Sindicato Rural/Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e a Associação Comercial de São José do Rio Preto, organizou, no dia 15 de agosto, a terceira edição da Reunião Técnica sobre Heveicultura, que neste ano teve como tema central a viabilidade desse consórcio no noroeste paulista. Na abertura do evento, o diretor da CATI Regional São José do Rio Preto fez questão de frisar que a instituição não está fazendo o fomento da cultura do cacau. “A nossa experiência acumulada, até o momento, não nos dá suporte para uma ação institucional visando ao fomento desse sistema, por isso estamos priorizando iniciativas que objetivam o domínio do conhecimento sobre o assunto e a divulgação para aqueles que, por iniciativa própria, optem por experimentar a implantação dessas lavouras em consorciação aqui na região”.

Muito interessado em informações que balizem a sua tomada de decisão, o público de cerca de 300 pessoas, formado por produtores, extensionistas, pesquisadores, estudantes e professores das Ciências Agrárias e Ambiental, e empresários, acompanhou atentamente as palestras ministradas por especialistas da CATI e do Centro de Excelência de Política do Cacau, o Ceplac, órgão ligado ao Ministério da Agricultura, localizado na Bahia, Estado que concentra a maior produção de cacau do Brasil. “Esse projeto tem gerado grande interesse, pois vem se mostrando um incentivo à manutenção da heveicultura paulista. Com a queda de preço da borracha natural e do látex, nós, produtores, buscamos agregar valor nessa que é a nossa atividade principal. E o consórcio com o cacau se mostra uma boa alternativa, pois possibilita o aumento da rentabilidade de uma área que já existe, com um produto que tem uma grande mercado. Tenho uma área subutilizada na propriedade na qual pretendo instalar o sistema. Estou sempre em contato com a CATI e aguardando os estudos avançarem um pouco mais, para investir. Mas, pelo que vi neste encontro, as perspectivas são muito boas”, avaliou José Henrique Mariani, produtor do sítio Santo Antônio, localizado no município de Mirassol.

Em sua palestra, Fioravante Neto traçou um panorama das ações para divulgação do consórcio. “Muitos agricultores têm se mostrado dispostos a investir na cacauicultura, baseados no histórico da commodity e na projeção de cenários favoráveis. Agora, com nossos parceiros temos empreendido esforços para apoiar a validação de tecnologias que possam nortear os produtores na implantação, manejo e exploração de áreas com seringueira e cacau no modelo SAF, principalmente no que se refere a eleição de clones de cacueiro, produção de mudas, espaçamentos, plantio, nutrição, fertirrigação, tratos culturais, manejo integrado de pragas e doenças, mecanização e pós-colheita”, salienta, lembrando que, já na década de 1970, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento, por meio do Instituto Agronômico (IAC), de Campinas, realizou pesquisas para verificar a viabilidade da cultura no Estado.

Palestrantes do evento, os pesquisadores do Ceplac mostraram-se otimistas quanto à viabilidade da cultura cacueira na região. “Em outros estados, principalmente na Bahia, temos grandes experiências desse consórcio. Já em São Paulo, por ser uma atividade nova, em uma região que não tem tradição no cultivo, é preciso experimentar clones, definir espaçamentos e a melhor época de plantio, e, principalmente, escolher mudas de qualidade, pois são elas que garantirão a sustentabilidade de um cultivo duradouro com a seringueira. Observamos que existem gargalos na produção local como a poda do cacaueiro e a produção de mudas, mas também muitas potencialidades na região. Com o profissionalismo dos produtores paulistas e com o apoio que a CATI vem dando, e a disponibilização de conhecimento e tecnologia, esse sistema terá sucesso no Estado”, analisou o pesquisador George Andrade Sodré, que também é professor da Universidade Santa Cruz, na Bahia, o qual além de receber os extensionistas da CATI no Ceplac, no mês de abril, se mostrou satisfeito em conhecer as áreas pioneiras da região e discutir estratégias para o aprimoramento do manejo.

Compartilhando a opinião do colega sobre a viabilidade econômica do sistema em São Paulo, José Basílio Vieira Leite, também pesquisador do Ceplac, destacou a importância da validação de tecnologia para o sucesso do cultivo. “Esta é uma área com potencial técnico para o cultivo do cacaueiro com produtividade elevada, seja em sistema solteiro ou em consórcio. No entanto é preciso capacitar as pessoas para trabalhar com as especificidades do sistema. Quanto à viabilidade econômica, é preciso fazer mais estudos para validar, mas o que podemos ressaltar é que ele é indicado tanto para pequenos produtores como para grandes empresários, com alto poder de agregação de valor, em razão do seu processamento”, disse o pesquisador, que ao ser questionado sobre a viabilidade de os agricultores familiares fazerem o processamento, avaliou: “Existem diversas máquinas de beneficiamento para que os pequenos agricultores possam processar o cacau em agroindústrias artesanais. Na Bahia temos muitos exemplos de agricultores organizados em cooperativas e/ou associações que estão produzindo chocolates finos, com elevado teor de cacau, e comercializando com alto valor agregado. Por isso, que digo que cultivo de cacau é um instrumento de desenvolvimento socioeconômico e ambiental, pois gera renda, emprego e sustentabilidade ambiental, por estar atrelado a sistemas agroflorestais”.

Para Carlos Alberto De Luca, coordenador do Projeto Heveicultura da CATI e membro da Câmara Setorial da Seringueira na Secretaria de Agricultura, esse consórcio tem tudo para dar certo no Planalto Paulista. “A heveicultura é muito importante do ponto de vista socioeconômico e ambiental, os preços do coágulo da borracha estão retraídos e os trabalhadores ficam dois ou três meses parados na entressafra. Portanto, esse consórcio é mais uma oportunidade, inclusive para o pequeno produtor, pois o consórcio com cacau é viável, desde que sejam observadas as Boas Práticas e adotadas tecnologias como a irrigação. Com o grande mercado que temos para o cacau no Estado, os produtores poderão auferir mais renda, otimizando a mão de obra, pois a cultura será manejada em épocas diferentes da seringueira”.

 


Aos interessados em conhecer ou adotar o consórcio seringueira e cacau, a orientação é procurar a CATI. “Cada sistema de plantio (box, plantios novos ou sombreados têm suas particularidades, então é imprescindível que o produtor nos procure para que possamos indicar os melhores materiais e o manejo adequado para a realidade de cada propriedade, a partir do conhecimento que estamos aprimorando junto com os pesquisadores do Ceplac”, orienta Andrey Vetorelli.

Aspectos que levam o Estado de São Paulo, principalmente a região do Planalto Paulista, a ser uma região promissora para a cultura cacaueira

. Estradas em boas condições (logística facilitada).
. Capilaridade na assistência técnica e extensão rural (basicamente todos municípios contam com a presença da CATI).
. Tradição em ações associativas, por conta do legado dos Projetos Microbacias I e II.
. Amplo mercado consumidor (população com cerca de 45 milhões de habitantes)
. Zona de escape das principais doenças da cultura do cacau, pelo histórico de cultivo em pesquisas do Instituto Agrônomico (IAC), de Campinas, na década de 1970.
. Incentivo à adoção racional de tecnologias (exemplo: irrigação).
. Condições edafoclimáticas adequadas e resultados iniciais de produtividade na ordem de 500kg de amêndoas/hectare, nas áreas de consórcios já existentes em início de produção.
. Agricultores paulistas estão dispostos a investir na cacauicultura, com base no histórico da commodity e na projeção futura de cenários favoráveis para a cultura.

Resultados esperados

Segundo os integrantes do grupo técnico de heveicultura da CATI Regional São José do Rio Preto, entre os resultados prospectados com a implantação dos consórcio estão:

. produtividade média de amêndoas/hectare em torno de 700kg com uso do protocolo de Boas Práticas e adequação de tecnologias;
. bom retorno econômico em virtude do preço do cacau que geralmente fica próximo de US$ 2.000,00/tonelada (cerca de R$ 7,00/kg de amêndoa);
. fortalecimento das economias paulista e nacional com a produção de cerca de 70 mil toneladas de amêndoas, gerando de forma direta receitas na ordem de US$ 140 milhões (somente com a comercialização direta);
. geração de novos postos de emprego;
. transferência de renda a pequenos produtores e à economia de pequenos municípios;
. implantação de modelo ambientalmente sustentável e com responsabilidade social, com instalação de consórcios em áreas de florestas plantadas e respeito às normas trabalhistas vigentes;
. implementação da cultura do cooperativismo, melhorando as relações comerciais e permitindo a padronização da produção com características de excelência;
. criação de um selo de origem e rastreabilidade.

 

Fonte: Cleusa Pinheiro - Jornalista - Centro de Comunicação Rural (Cecor/CATI).

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